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Aprendi a esperar



Luciano R. Rodrigues*
Não me lembro qual foi a primeira coisa que aprendi, nem qual a primeira palavra que disse. Pode ter sido “mamãe”, como sempre acontece nos desenhos animados e nos filmes, ou pode ter sido “tô com fome”, que foi, sem sombra de dúvida, a frase que minha mãe mais ouviu de mim desde que aprendi a falar.

E também acho engraçado quando me perguntam qual a última coisa que aprendi e respondo, sempre bem-humorado e parafraseando Chaves: “Eu ainda não aprendi pela última vez”. Embora no seriado em exibição há quase três décadas na TV a piada seja com tomar banho, acho que a minha versão é uma grande verdade que aprendi.

Meu pai, por exemplo, que aprendeu muito desde que o conheço (tempo que equivale a toda a minha vida), vive repetindo que não importa o quanto você sabe, sempre vai ter alguém que sabe mais do que você. E vejo que ele tem razão, que desde que o médico me deu aquela palmada na sala de parto para que eu chorasse (deve ter sido mesmo minha primeira lição, essa coisa de chorar) que eu tenho aprendido, num processo constante, infindável e delicioso.

Aprendi a falar e a escutar, embora nem sempre esteja realmente ouvindo (principalmente quando estou digitando no computador, mesmo que esteja olhando para a pessoa, ao invés do teclado). Aprendi a ter amigos, embora não tenho aprendido a perdê-los e nem a ter inimigos. Aprendi a amar, mas só depois de aprender a superar quando as coisas dão errado e é preciso recomeçar tudo. Da mesma maneira que aprendi a chorar sozinho e não derramar lágrimas em público, para compactuar com o senso comum de que homem não chora. Aliás, isso me fez aprender que às vezes se desacredita na verdade e confia na mentira e que nem todas têm pernas curtas. Aprendi a digitar, a usar o computador (o que seria de mim sem ele?), nadar, andar de bicicleta e dirigir; a cantar desafinado, ler em voz alta e um pouco de inglês, espanhol e até japonês; um pouco de desenho, violão, karatê, e outros cursos que comecei pra nunca mais terminar. Aprendi que o escuro é só carente de luz, embora eu ainda tenha pesadelos com os zumbis de “A volta dos mortos-vivos” em algumas noites.

Com tanta coisa que já aprendi, é difícil fazer uma escala de importância, mas posso afirmar, com absoluta certeza, que aprender a ler e a escrever figuram no “Top Five”. Hoje sou capaz de realizar essas duas tarefas tão corriqueiras com razoável destreza, consigo ler e entender um texto só de passar os olhos por ele (habilidade que desenvolvi lendo trechos de gibis em bancas de jornal antes que o dono proibisse de folheá-las); e o tempo e o treino fizeram da palavra escrita uma amiga íntima e uma forma de me expressar com extrema paixão. Mas isso não surgiu do nada, não foi um dom divino que apareceu como o acender de uma luz.

Recordo-me dos primeiros passos para entender aquele monte de símbolos alienígenas e indecifráveis e o quanto eu odiava ter de pedir para que alguém lesse algo para mim. Lembro-me da minha companheira, a Caminho Suave, minha primeira cartilha, aquela espertinha, que me marcou com a “barriga do bebê” e do pobre cão que come na cuia. Vejo hoje minha jovem sobrinha passando pelo mesmo processo, e como é maravilhoso ficar lendo tudo o que se vê, muitas vezes devagar e em voz alta, e a satisfação de entender o que aquele punhado de letras significa.

E não consigo me imaginar num mundo onde esse prazer não seja possível. Onde a satisfação de ler um texto e compreender o que o autor quis nos dizer possa ser substituída. Acho até que, se as pessoas lessem mais, refletiriam melhor e teriam menos tempo para mal-dizer o próximo ou para planejar guerras, para atentar contra outros. E talvez, assim, o mundo fosse mais parecido com uma biblioteca: mais silencioso, mais agradável e com muitas prateleiras de sabedoria para compartilharmos.

* Jornalista//escritor
Assessor de imprensa da Prefeitura de Itupeva - SP
E-mail: lurodriguez@rabiscando.com


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