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Educação Física Escolar: Você realmente sabé o que é?

Prof. Márcio Abensur*
No ano em que a Secretaria de Estado de NEducação (SEDUC) finalmente passa a cumprir o disposto em legislação federal, no que diz respeito à obrigatoriedade da disciplina educação física em todos os níveis da educação básica (Lei 9.394/96) e ministrada por profissional graduado na respectiva área (Lei 9.696/98), fomos consultados por vários leitores sobre o porquê de o profissional de educação física ministrar aulas também na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental (1º ao 5º ano), já que tradicionalmente as crianças têm a professora de educação infantil que pode ministrar recreação.

As duas leis federais acima citadas já seriam argumento suficiente para justificarmos tal presença, mas, para que se compreenda a importância do profissional de educação física nesses segmentos, vamos apresentar argumentos técnico-científicos e técnico-profissionais. Primeiramente, observemos a enorme diferença entre educação física e recreação, recorrendo à Resolução CONFEF Nº 046, de 18 de fevereiro de 2002, que dispõe sobre a intervenção do Profissional de Educação Física, respectivas competências e campos de atuação:

No âmbito da Intervenção do Profissional de Educação Física, a atividade física compreende a totalidade de movimentos corporais, executados no contexto de diversas práticas: ginásticas, exercícios físicos, desportos, jogos, lutas, capoeira, artes marciais, danças, atividades rítmicas, expressivas e acrobáticas, musculação, lazer, recreação, reabilitação, ergonomia, relaxamento corporal, ioga, exercícios compensatórios à atividade laboral e do cotidiano e outras práticas corporais. (grifo nosso)

Como se pode notar, recreação é apenas uma das muitas manifestações do movimento humano, competência do profissional de educação física, que tem a atuação bastante diferente da atuação da professora (ou professor) de educação infantil. Enquanto o docente com formação multidisciplinar tem o papel fundamental de educar as crianças no contexto cognitivo (principalmente leitura, escrita e calculo), o profissional de educação física, professor da disciplina, tem a incumbência de desenvolver o aluno integralmente, podendo, por meio de técnicas e exercícios específicos, trabalhar a educação e a saúde de seus discentes. O professor de educação infantil, obviamente, utiliza-se também de atividades recreativas para educar seus alunos, mas tais brincadeiras não são selecionadas com finalidades preventivas ou reeducativas para distúrbios ou dificuldades de aprendizagem, por exemplo. Em outras palavras, uma atividade empregada pelo professor de educação física sempre será definida com um objetivo específico e como um processo metodológico e sistemático, voltado a trabalhar aspectos inerentes ao desenvolvimento do educando, independentemente de ser esta atividade recreação, jogo, ginástica, esporte, exercício psicomotor ou neuróbico, entre outros.


Por outro lado, não se pode negar que durante muito tempo as aulas de educação física escolar foram rotuladas como momento de lazer ou de condicionar o corpo, chegando até ao cúmulo de serem discriminadas pelas demais disciplinas por sua suposta irrelevância no rol de estímulos ao conhecimento do aluno. Tal estigma perdurou por bastante tempo, reforçado pelas “aulas” ministradas por leigos contratados pela escola, que considerava a disciplina uma prática que qualquer pessoa poderia conduzir. Infelizmente, a escola ainda não descobriu o que realmente é a educação física, afinal, assim como o “pratico”, vários docentes de outras áreas já ministraram “aulas” dessa disciplina e acreditam que podem, inclusive, discutir com o profissional da respectiva área sobre como o mesmo deve atuar. E aqui estamos nós, tentando explicar o que deveria ser do conhecimento de todos.

 
Dentre as várias ações desenvolvidas pelo professor de educação física, podemos citar uma que, apesar de atribuição própria, não é conhecida como tal pelos demais docentes da educação básica : a avaliação motora/psicomotora. Esta é um complemento indispensável na atuação do profissional de educação física e um elemento de fundamental importância na observação dos vários problemas de adaptação que o aluno pode apresentar. Rosa Neto (2002) define o exame motor como o ponto de partida para a intervenção educacional, pois, a partir do mesmo, o professor de educação física poderá evidenciar dificuldades ligadas a transtornos d a coordenação motora , transtornos específicos de desenvolvimento neuropsicomotor, hiperatividade, alterações de conduta e dificuldades de aprendizagem escolar.

Para a surpresa do leitor, é justamente o professor da disciplina comumente tida como sem importância na escola, que tem a responsabilidade de avaliar o aluno para estabelecer linhas de atuação voltadas à prevenção dessas dificuldades e, para os casos específicos, definir as atividades mais adequadas para as ações de reeducação motora/psicomotora. Vejamos o que diz a Resolução CNE/CES Nº 7, de 5 de abril de 2004 (Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em Educação Física), que em seu artigo 6º, § 1º, trata sobre a formação do graduado em educação física, citando dentre suas competências e habilidades:

Diagnosticar os interesses, as expectativas e as necessidades das pessoas (crianças, jovens, adultos, idosos, pessoas portadoras de deficiência, de grupos e comunidades especiais) de modo a planejar, prescrever, ensinar, orientar, assessorar, supervisionar, controlar e avaliar projetos e programas de atividades físicas, recreativas e esportivas nas perspectivas da preve nção, promoção, proteção e reabilitação da saúde, da formação cultural, da educação e reeducação motora, do rendimento físico-esportivo, do lazer e de outros campos que oportunizem ou venham a oportunizar a prática de atividades físicas, recreativas e esportivas. (grifo nosso)

Observemos novamente a Resolução CONFEF Nº 046/2002, no que tange ao exercício profissional em educação física:

O Profissional de Educação Física exerce suas atividades por meio de intervenções, legitimadas por diagnósticos, utilizando-se de métodos e técnicas específicas, de consulta, de avaliação, de prescrição e de orientação de sessões de atividades físicas e intelectivas , com fins educacionais, recreacionais, de treinamento e de promoção da saúde, observando a Legislação pertinente e o Código de Ética Profissional e, sujeito à fiscalização em suas intervenções no exercício profissional pelo Sistema CONFEF/CREFs.


A imagem a seguir retrata a avaliação motora de um aluno de 12 anos de idade, que apresentou um déficit de 3 anos em relação à sua idade cronológica, ou seja, apenas 9 anos de idade motora . Lembremos que desenvolvimento motor e cognição caminham juntos, de forma que a capacidade intelectual deve ser coerente com a capacidade motriz.

A partir daí, o professor de educação física definiria as atividades mais adequadas e coerentes com a necessidade e característica do aluno ou da turma. Ainda que a atividade definida fosse uma ação recreativa, esta seria prescrita com finalidade específica e num processo metodológico e sistemático, obviamente, sem o conhecimento do aluno, afinal, a ele interessa apenas explorar seu potencial motriz.

Continua na próxima edição...

marcioabensur@ifam.edu.br




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